BUAISOU NA JAPAN HOUSE
worldfashion • 12/03/25, 18:49Em 2015 a BUAISOU, foi fundada como um ateliê, com os artesãos que cuidam de todos os processos, desde a semeadura do índigo até o tingimento das roupas. Kakuo Kaji - o representante do BUAISOU, que veio ao Brasil, é o artista e artesão de tingimento de índigo. Nascido em Aomori, aprendeu sobre design têxtil no curso de Design Têxtil na Universidade Zokei de Tóquio e durante sua graduação conheceu o tingimento natural. Depois de se formar, ele se juntou a uma equipe de voluntários de revitalização regional da província de Tokushima para conhecer o índigo. Lá ele aprendeu as técnicas básicas, desde o cultivo até a produção do sukumo (corante) do índigo, e foi expandindo seus conhecimentos criativos de forma autodidata. Em 2012, inicia as atividades do BUAISOU, enquanto participa de trabalhos de revitalização regional. Em 2015, fundou a empresa em Tokushima e Nova Iorque simultaneamente. Todas as obras de BUAISOU são produzidas por ele.
Abaixo a transcrição das declarações e considerações de Kakuo Kaji na JAPAN HOUSE na abertura do workshop sobre “ Preparo da tina de tingimento com índigo japonês ” e a oficina do “ Tingimento com índigo japonês e KATAZOME *” (*que utiliza uma pasta de arroz e estêncil para a criação de padrões e desenhos no tecido) de uma peça com a técnica AIZOME* (*conhecida por gerar diferentes tonalidades de azul), produzidas a partir de processos naturais e sustentáveis, conforme ilustrado no vídeo.
KAKUO KAJI :
- Agradeço o convite de estar no Brasil, um país muito lindo e estou surpreendido pelo interesse despertado que o workshop despertou no grande público, pois no Japão não há tantos interessados e estamos muito impactados e felizes com as apresentações. Tivemos muita sorte de estarmos na época do carnaval e ter tido a oportunidade de estarmos no sambódromo, e como profissional que trabalha com cores admirei muito ver tantas cores e como japones ouvir o som foi muito impactante, levarei muitas reflexões deste momento.
- No meu trabalho, nas abordagens com as cores, não estou muito preocupado com a emoção que a determida cor vai transmitir e sim em como atingir a cor que quero atingir, a cor que desejo e penso em como conseguir.
- Quando comecei trabalhar com as cores não tinha muita conciência de como é fazer uma determinada cor, porque quando trabalhamos com guache escolhemos uma determinada cor que queremos pintar e a gente escolhe e a cor que queremos. Mas quando trabalhamos com o tingimento natural ou com outras referencias de tingimentos naturais, já trabalhei como galhos, cascas e folhas, mas no caso do índigo é diferente, começamos do zero pela semente e isto realmente me encantou e por isso me especializei no cultivo e no tingimento do índigo.
- Como foi abordado na abertura a questão da sutentabilidade, quando eu comecei a trabalhar com o índigo, não tinha esta visão e esta abordagem e as pessoas começaram a falar que era um processo sustentável e aí comecei a tomar conciência.
- Aqui vocês devem estar com uma expectativa de que sigo um abordagem e métodos tradicionais, mas eu confesso não sigo esta visão do tradicional e tenho a sorte de estar numa empresa e que usa referências do tradicional, mas temos a nossa própria abordagem.
- E pensando sobre o que é tingimento tradicional (AIZOMÊ) por exemplo do mestre Kiri, eu não faço parte, sou a primeira geração ainda e não tenho a tradição centenária na nossa casa, então hoje inclusive, quando as pessoas falam, eu questiono sobre este conceito do que é tradicional, hoje nos temos uma abordagem muito mais livre e fico feliz por isto.
- Então precisamos pensar em como vamos transmitir esta nossa aboradagem como, vamos transmitir a cor que nos criamos e de fato divulgamos através dos nossos objetos e produtos e também com abordagens como estas que estamos mostrando aqui para vocês.
- E cor apesar de parecer natural, é apenas cor, então é fácil enganar as pessoas sobre o tigimento natural, sendo que não é, pois a cor é apenas cor.
- Então o que seria ideal é divulgar o máximo possível, transmitir o máximo possível, o como é a forma do tingimento natural, no Japão tem locais que fazem os tingimentos, onde as pessoas entregam as pessoas e são feitos os tingimentos.
Com relação ao processo da plantação, cultivo e colheita do planta índigo, que inclusive é uma planta comestivel, seguem abaixo algumas considerações:
- Entre janeiro, fevereiro a março no grande inverno, é feito o preparo da terra, na província de Tokushima, onde vários agricultores especializados, se dedicam ao cultivo do índigo. O agricultor produz o índigo sem utilizar defensivos químicos, só herbicidas, pesticidas e de forma natural, é ruim pois dá muito trabalho, mas a planta é utilizada também para o alimento.
- E é claro que todos esses pesticidas e tudo mais são desenvolvidos para que não impactem a saúde das pessoas. Sempre pensando em como as pessoas faziam antigamente, quando não existiam os produtos químicos e utilizam estas reflexões nas iniciativas deles.
- E claro, cada pessoa vai pensar de uma maneira, mas nós não queremos utilizar esses instrumentos químicos, porque se a gente fosse pensar que o índigo é um alimento, então será que a gente conseguiria comer se tivéssemos usando um pesticida? Na verdade, impactará o planeta e nós repetimos muito que não queremos usar implementos químicos no nosso cultivo.
- O Japão entra na primavera a partir de março, então a semente é cultivada nesta época. E quando essa muda atinge 10 cm mais ou menos é transplantada para o campo
- E é quando inicia a correria porque no entorno das plantas do índigo começam a crescer as ervas daninhas, e aí, precisam ser tiradas ao máximo essas ervas, pois na hora da colheita a máquina mistura tudo e no processo com certeza acabará impactando na qualidade. Não é algo extremamente produtivo, mas nós fazemos questão de tirar todas as ervas daninhas.
- No final de junho, então é o momento que nós vamos fazer a colheita e a planta verde índigo está mais ou menos na altura do quadril. E depois que nós colhemos, nós secamos com uma máquina e levamos para uma sala cheia de ventiladores, para que as folhas, que são mais leves vão lá para o fundo da sala e os caules as partes mais densas fiquem no começo da sala e assim separamos o caule.
- Uma das características peculiares, do índigo japonês é que o pigmento está apenas nas folhas, então há necessidade de ter um local para separar os elementos, as impurezas, então fazemos questão de fazer ao máximo essa separação.
- Quando você vê a folha crua apesar de estar ainda verde, quando ela seca tem aspectos, mais azulados, mas a parte do caule é mais amarelada, então já dá para ver essa diferença. Isto mostra que o caule não tem pigmento.
- No final de setembro, o Japão fica mais frio é quando o índigo começa a florir, a direção dos pigmentos já não ficam tão forte, tão concentrado nas folhas, então é o fim desse ciclo, e a nossa batalha cotidiana é realmente finalizar o processo, até antes do final de setembro, que é quando paramos o cultivo.
- No inverno toda aquela folha seca, ela vai precisar ser fermentada pra criar nosso brilho. E pra fazer essa pigmentação, temos um quarto específico, literalmente significa o dormitório, o espaço de dormir, exatamente como se fala no Japão, que é fazer dormir e a partir do momento em que essas plantas começam a fermentar essas folhas secas começam a ficar mais quente. Elas vão gerando o calor do processo, então são cobertos com um cobertor de palha que se chama futon, que é literalmente, cobertor em japonês.
- Então uma vez por semana desfazermos esse monte colocamos água, fazemos buracos remexemos e cobrimos, com o futon novamente. Sim, vamos fazer isso uma vez por semana por 20 semanas.
- E fazendo esse processo de fermentação a cada ano, talvez a gente tenha uns dias a mais outros a menos, mas no geral, nós fazemos isso por 120 dias a 140 dias e o resultado são as folhas secas compostadas, chamadas de sucumon.
- Então, o nosso pigmento, o que a gente vai usar pra atingir é uma mistura das folhas secas com água com oxigênio e o resultado depois de 120 a 140 dias parece tempo mesmo.
- Por que que nós fazemos isso? porque se dá pra esse trabalho? porque quando nós fazemos essa compostagem, nós conseguimos guardar esse pigmento por mais tempo. Ele fica muito mais fácil de preservar.
- Um segundo ponto é que o verão no Japão, é limitado, um período de 3 meses, então não dá pra cultivar o ano todo. Além disso, o Japão é um país que tem sido atingido por muitos desastres naturais como muito tufão, por exemplo, então talvez em alguns anos o cultivo não ia ter tanto sucesso assim por pelo menos mais de 10 anos.
- Um outro benefício que é comum essas folhas que estão super concentradas e compostadas conseguirem rapidamente atingir uma cor mais segmentada, uma cor mais forte.
- Se a gente pensa no volume, das folhas secas, nós não temos espaço para conseguir armazenar, mas quando a gente faz o processo de compostagem e conseguimos misturar uma quantidade gigante de folhas, e assim conseguir produzir líquido que é utilizado para o atingimento.
- Há várias formas de produzir o índigo, essa é uma forma que é muito específica do Japão. No Brasil, na Índia ou em países africanos, a forma de fazer esse pigmento é totalmente diferente. E uma das características diferentes é a própria planta. No caso tem muitos que têm o pigmento tanto na folha quanto no caule.
- Vou explicando para vocês só pra vocês terem uma noção de como se faz:
Numa tina de índigo folha e caule, coloca num tanque cheio de água e vai fazer com que essas folhas e caule fiquem por 3 dias e vai começar a fermentar. E a cor da água desse tanque vai ficar meio azul esverdeada. E então essas folhas e caules são retiradas. A gente vai contar uma mistura com cal e vai mexer muitas vezes, para fazer com que o oxigênio incorpore essa mistura. Então, por meio do oxigênio, essa mistura vai oxidando, e com o tempo os pigmentos também vão decantar. E aí, você joga aquele líquido que ficar na parte superior e o que sobra que dá em um aspecto pastoso é o pigmento em si.
- E essa pasta é que vai ser incorporada na tina, então, quando a gente parar pra pensar o tempo de preparo, dessa pasta, o método tradicional e aqui no Brasil, por exemplo, outras regiões do Japão, é totalmente diferente.
A Japan House São Paulo (JHSP) trouxe em comemoração aos 130 anos do Tratado de Amizade Brasil-Japão, pela primeira vez, o coletivo de artesãos japoneses BUAISOU. A JHSP é uma iniciativa internacional com a finalidade de ampliar o conhecimento sobre a cultura japonesa da atualidade e divulgar políticas governamentais. Inaugurada em 30 de abril de 2017, a Japan House São Paulo foi a primeira a abrir suas portas, seguida pelas unidades de Londres e Los Angeles. Estabelecida como um dos principais pontos de interesse da celebrada Avenida Paulista, a JHSP destaca em sua fachada proposta pelo arquiteto Kengo Kuma, a arte japonesa do encaixe usando a madeira Hinoki. Desde 2017, a instituição promoveu mais de 48 exposições e cerca de mil eventos em áreas como arquitetura, tecnologia, gastronomia, moda e arte, para os quais recebeu mais de 3,5 milhões de visitantes. A oferta digital da instituição foi impulsionada e diversificada durante a Pandemia de Covid-19, atingindo mais de sete milhões de pessoas em 2020. No mesmo ano, expandiu geograficamente suas atividades para outros estados brasileiros e países da América Latina. A JHSP é certificada pelo LEED na categoria Platinum, o mais alto nível de sustentabilidade de edificações.
Por Yuko Suzuki Crédito das imagens do vídeo de Ale Virgílio
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