World Fashion + Varejo edição 156 - page 11

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edição 156
A REVISTA PARA OS PROFISSIONAIS DA MODA
+foco
WORLD FASHION – A PRODUÇÃO E USO DE TECIDOS É ALGO QUE
ACOMPANHA A PRÓPRIA HISTÓRIA DA HUMANIDADE. NESSE SEN-
TIDO, COMO A SENHORA VÊ A RELAÇÃO DO TECIDO, UM ELEMENTO
INDISPENSÁVEL PARA O SER HUMANO – TANTO COMO PROTEÇÃO,
COMO PARA ADORNO CORPORAL –, COM ALTA TECNOLOGIA?
Reiko Sudo
– As pessoas vivem com um tecido
sobre a pele desde o nascimento até o kim da vida.
E até mesmo para a morte há um tecido que serve
de mortalha... Assim, podemos dizer que o tecido é,
realmente, uma segunda pele. Anteriormente, havia
um grande “gap” entre o artesanal e a produção in\
dustrial. Hoje, porém, essa distinção é muito tênue.
Isso parece mostrar que a criação de novos têxteis
passará pela livre manipulação da alta tecnologia.
O controle prático da alta tecnologia parece ser a
chave para a criação de qualidade, o que, de certa
forma, poderíamos chamar hoje de artesanal.
W. F. – NA SUA VISÃO, É POSSÍVEL A UNIÃO DE TÉCNICAS ANCES-
TRAIS DE TECELAGEM COM AS NOVAS TECNOLOGIAS USADAS HOJE
PELA INDÚSTRIA TÊXTIL?
R. S. –
Muitos tendem a pensar que as tecnologias
avançadas são uma bênção capaz de reduzir signiki\
cativamente o tempo e o trabalho. No entanto, con\
tinuamos a operar a tecnologia com as nossas pró\
prias mãos. Tanto é assim que nosso trabalho dentro
da Nuno, os têxteis são verdadeiramente resultado
da união entre a tecnologia e a produção artesanal.
W. F. – QUAIS SÃO OS PASSOS SEGUIDOS PARA ELABORAR O CON-
CEITO DE CRIAÇÃO DE TECIDOS QUE A NUNO DESENVOLVE?
R. S. –
Trabalho a partir de inspirações momentâ\
neas vindas da vida diária. Tenho um especial gosto
pelo toque dos materiais, do produto kinal. Mas não
é só: utilizou muito meu senso para sentir aquilo que
a minha pele pode me dizer em cada criação.
W. F. – A SUSTENTABILIDADE É UMA PREOCUPAÇÃO COMUM PARA A
MAIORIA DOS CONSUMIDORES DE HOJE. COMO DESIGNER DA ÁREA
TÊXTIL, A SENHORA ACREDITA QUE ESSE TIPO DE PREOCUPAÇÃO
PODE TER UMA INFLUÊNCIA DECISIVA SOBRE A INDÚSTRIA DO VES-
TUÁRIO, IMPONDO NOVOS LIMITES AO SISTEMA DE MODA RÁPIDA,
DA PRODUÇÃO EM MASSA, POR EXEMPLO?
R. S. –
No passado, as pessoas descobriram base de
plantas e as kibras longas para tecer. Não há muito
tempo, as roupas eram algo recosturado uma e ou\
tra vez, até que kinalmente terminavam sua vida útil
como panos... Hoje, a produção em massa signikica,
no entanto, que apenas consumimos roupas. Ago\
ra, mais do que nunca, se kizermos uma reklexão, o
nosso pensamento sobre kios e tecidos do início ao
kim poderá nos levar a uma maior consideração a
respeito da vida humana e da vida sobre a terra.
W. F. – SUAS CRIAÇÕES TÊM VISITADO VÁRIOS MUSEUS INTERNA-
CIONAIS DE RENOME, ATRAVÉS DE EXPOSIÇÕES REALIZADAS COM
SEUS DESENVOLVIMENTOS TÊXTEIS. A SENHORA ACREDITA QUE
SEU CONCEITO DE CRIAÇÃO JÁ FOI COMPREENDIDO PELA INDÚS-
TRIA DA MODA, PELAS MARCAS, DE TAL FORMA QUE POSSA IN-
FLUENCIAR O PROCESSO CRIATIVO DESSAS MARCAS?
R. S. –
Eu realmente não posso dizer se nossos têx\
teis têm inkluenciado diretamente alguma marca
de moda, embora constatemos que várias técnicas
e texturas têxteis que desenvolvemos estão sendo
usadas em roupas nacionais e estrangeiras. Isso é
algo em que podemos nos orgulhar.
W. F. – HÁ PARCERIA COM MARCAS DE MODA? QUAIS?
R. S. –
Sou obrigada a não mencionar nenhum no\
me em particular. Mas, sim, temos trabalhado com
marcas de moda japonesas e norte\americanas em
várias ocasiões.
W. F. – O DENIM É UMA MATÉRIA-PRIMA RECORRENTE EM SUAS CRIA-
ÇÕES E EXPERIMENTAÇÕES? O QUE O DENIM REPRESENTA PARA TO-
DO O SEU TRABALHO E TAMBÉM PARA A CULTURA TÊXTIL JAPONESA?
R. S. –
Os tecelões japoneses aprenderam muito da
França e da América. O Japão, entretanto, no período
de Edo (1600
1868), criou suas próprias técnicas de tin\
gimento em índigo, como as usadas para a vestimenta
Bigo kasuri
, feita de
ikat
em algodão. As técnicas locais
combinam as imperfeições do índigo a tramas brancas
para criar fortes estruturas, tecidas com desenhos dis\
tintivos, trouxeram uma nova dimensão ao denim.
W. F. – QUAIS SÃO AS SUAS SUGESTÕES PARA A INDÚSTRIA DA
MODA CONTEMPORÂNEA, QUE PROCURA CLARAMENTE NOVAS
FORMAS DE CRIAÇÃO, VISANDO À DIFERENCIAÇÃO DE PRODUTOS
E COLEÇÕES?
R. S. –
Indiscutivelmente, os dispositivos
wearab1
le
(portáveis) e os materiais digitais estarão entre o
que chamamos de “a próxima coisa” para marcas de
moda. Google, juntamente com a Levi´s, tem atuado
para desenvolver
smartphones
com sensores ope\
rando nas tramas do denim. Também estamos ven\
do a chamada eletroluminescência (EL) orgânica e
papel eletrônico usado em roupas e
sneakers
. Ao in\
corporar tecnologias de sensores corporais digitais,
vamos certamente ver uma grande tendência de
produção, sob demanda, de roupas, meias e roupas
íntimas por parte do consumidor. Da mesma forma
um aumento acentuado da customização realizada
individualmente.
W. F. – QUAIS SÃO, NA SUA OPINIÃO, SEUS TRABALHOS MAIS NO-
TÁVEIS?
R. S. –
Provavelmente
Feather Flurries
, que foi o que
me permitiu inicialmente a experimentação unindo
o trabalho manual à tecnologia, e
Polygami
, que nos
possibilitou produzir tecidos com pregas sem o uso
de um modelo de papel dobrado em origami.
W. F. – VOCÊ ACHA QUE OS DESIGNERS DE MODA JOVEM – PELO
MENOS NO JAPÃO – TÊM UMA PREOCUPAÇÃO REAL COM A CRIAÇÃO
E O DESENVOLVIMENTO DE NOVOS TECIDOS, SEJA POR RAZÕES DE
SUSTENTABILIDADE, SEJA PARA DAR UM CARÁTER AUTORAL ÀS
CRIAÇÕES?
R. S. –
O famoso aforismo de Vivienne Westwood –
“compre bem, escolha bem, faça o durar” – enquadra
ekicazmente o discurso sobre qualidade e moda sus\
tentável. Suas palavras não só questionam a relação
existente entre moda e novos estilos emergentes de
vida, como ressaltam o legado da roupa como coisas
de valor que deve ser mantida com cuidado. Simul\
taneamente, estamos vendo novos valores, criadores
mais jovens propondo novas dekinições de moda e
insinuando o que esse gênero conhecido como
cou1
ture
poderia se tornar. Rekiro\me a designers como
Yukinori Maeda (CosmicWonder) e Kunihiko Morinaga
(Anrealage). Da mesma forma, devemos kicar atentos
a
Muji’s ReMuji Project
, pelo qual roupas usadas em
bom estado são coletadas, classikicadas e, em segui\
da, lavadas e tingidas com índigo para revenda. Nos
velhos tempos, todos os locais no Japão tinham a sua
própria tinturaria
koya
, onde as pessoas iam para “pro\
longar” longa a vida de suas roupas e artigos têxteis.
ReMuji é o ressurgimento da sabedoria da tradição
contida em um cada vez mais prático estilo de vida.
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